quinta-feira, 25 de junho de 2015

Pezão diz que Justiça tem liberdade para atuar no caso Amarildo


Nesta terça, 14 agentes do Bope foram afastados de suas atividades.
'Nós não compactuamos com o erro', disse governador.

Do G1 Rio
O governador do Rio, Luiz Fernando Pezão disse que a Justiça tem liberdade para apurar a possível responsabilidade dos policiais do Batalhão de Policiamento Especial (Bope), no desaparecimento do ajudante de pedreiro, Amarildo de Souza. Segundo o governador, o estado não compactua com o "erro". A declaração ocorreu na manhã desta quarta-feira (24), no Palácio Guanabara, após evento no Palácio Guanabara sobre o Comitê Rio 2016.

 ''Acho que o Ministério Público está fazendo seu papel. Importante registrar que tem hoje 12 policiais presos no caso Amarildo. A Justiça está vendo com toda liberdade. É importante ressaltar que foram as câmeras que nós colocamos na Rocinha que possibilitaram fazer estas investigações. Da Delegacia de Homicídios poder entrar na Rocinha, como entra no Alemão e em outras comunidades. E desvendar os autores do crime. Isso era impossível antes de 2007. A gente vai atender a tudo que a Justiça determinar", afirmou o governador.
Pezão também comentou sobre o aumento do número de policiais no estado nos últimos anos: ''Se teve um governo que cortou na própria carne foi o nosso. Nós já cortamos mais de 1900, quase 2 mil policiais nestes últimos oito anos e seis meses de governo. Nós não compactuamos com o erro.''
Amarildo Rio de Janeiro Crime RocinhaJG (Foto: Reprodução: TV Globo)A|udante de pedreiro Amarildo de Souza
(Foto: Reprodução: TV Globo)
Nesta terça (23), a Polícia Militar afastou das funções os 14 policiais do Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar (Bope), que estiveram na Rocinha na noite em que  Amarildo teria sido morto. A PM afirma que não divulgará os nomes dos agentes envolvidos, mas diz que eles serão ouvidos no novo inquérito que foi aberto pela Polícia Militar no início da semana.
A promotora de Justiça Carmen Eliza Bastos de Carvalho afirmou nesta terça (23) que uma nova investigação será aberta para apurar a possível participação de 10 policiais do Bope na ocultação do corpo do pedreiro Amarildo.
De acordo com ela, durante a preparação das alegações finais do inquérito, o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) encomendou uma análise das imagens de câmeras de segurança e constatou a presença de um volume em uma das caminhonetes que estiveram no local durante o episódio.
"Há alguns dias chegamos a essa conclusão da imagem porque foi um trabalho de perícia. Estávamos preparando as alegações finais do inquérito quando o nosso departamento de perícia constatou que aquele volume tinha profundidade. Eles verificaram que o tamanho daquele volume não era incompatível com o volume de um corpo. Diante desses dados, nós começamos então a analisar os elementos que estavam em torno dessa viatura, relacionados ao Bope. Essa investigação, daqui para frente, será da central de inquéritos", afirmou.
Ainda de acordo com a promotora, algumas contradições foram percebidas durante o caso que aconteceu em 2013. Uma informação oficial anterior dizia que o sistema de GPS dos carros do Bope estava funcionando.
Posteriormente, uma informação não oficial diz que houve uma hora de "branco", não tendo registro do percurso. O caso será investigado pela promotora de justiça  Marisa Paiva da 15ª Promotoria de Investigação Penal.

O porta-voz da Polícia Militar do Rio de Janeiro, coronel Frederico Caldas, disse que as novas informações surpreenderam o comando da corporação e enfatizou que o novo Inquérito Policial Militar vai ajudar a esclarecer as contradições sobre o caso.

"Essa história já foi contada anteriormente. Então, com essas imagens e com a exposição dessas possibilidades que emergem agora, certamente, isso tudo precisa que sejam feitos novos depoimentos e que sejam confrontados com os depoimentos que deram anteriormente e especialmente que sejam capazes de explicar o por quê desse deslocamento, o por quê dessa parada, eventualmente certificar de que de fato o GPS foi desligado e por quê que foi desligado. Então, é importante a instauração desse IPM porque ele vai, exatamente, jogar luz sobre essas contradições e essas falhas que eventualmente foram detectadas", disse Caldas.
Bope demorou duas horas para chegar na Rocinha
Ainda de acordo com a promotora Carmem Eliza Bastos, algumas informações devem ser analisadas além das imagens periciadas. Em depoimento na época, policiais alegaram que o Bope teria sido chamado por causa de uma suposta iminência de ataque na comunidade da Rocinha. No entanto, as equipes só teriam chegado ao local duas horas após o chamado.
"A informação oficial é de que o Bope tinha sido chamado porque havia uma iminência de ataque. E, por outro lado, nós verificamos que policiais, nessa circunstância de ataque, teriam sido dispensados por volta de 22h. Então parece contraditório, porque você tem uma ameaça de ataque a uma sede de UPP e os policiais militares que lá trabalham foram dispensados. Por outro lado, O Bope é acionado às 22h e só chega ao local às 00h. Então são duas horas para chegar em um local de iminência de ataque. Isso são circunstância que se agregam a constatação de um volume em uma viatura. São circunstâncias que merecem ser investigadas, não estamos trabalhando com convicções", disse.
Viúva diz sentir medo de represália
A viúva do pedreiro Amarildo de Souza comemorou, na manhã desta terça-feira (23), a reabertura do inquérito que investiga a morte de seu marido, mas também disse estar com medo de represálias de policiais. “Eu adorei, gostei, porque o caso do meu marido estava quase ficando impune, porque a gente não sabia o que aconteceu. Sumiu o corpo, ninguém sabia até hoje o que tinha acontecido, dois anos que a gente não tinha resposta do corpo do Amarildo e agora, graças a Deus e a Justiça, que fez essa reabertura”, afirmou Elizabeth Gomes da Silva.
 No entanto, a viúva destacou que sente medo de sofrer represália por parte dos policiais que teriam matado seu marido. “Espero que a Justiça faça eles ‘falar’ cadê os restos mortais de Amarildo para a família poder enterrar como digno. Só que a gente, eu e minha família, ‘tem’ medo de sofrer represália deles. Como eles entraram dentro da Rocinha, fizeram uma operação mentirosa, negativa e não era operação nenhuma. Era para poder entrar dentro da Rocinha e pegar o corpo do meu marido, tanto que o carro estava desligado, fizeram num lugar que não tinha câmera para filmar”, disse Elizabeth
Peritos analisam imagens
As novas imagens mostram que a primeira e a segunda caminhonete do Bope chegam sem ninguém na caçamba. Só a terceira e a quarta caminhonetes têm policias armados na parte traseira. Cada uma, com dois homens.
Quando o comboio acaba de entrar, ainda não é meia-noite. Os promotores descobriram que todas as quatro caminhonetes passaram pelo local com os GPS ligados. Na sede da UPP, no entanto, o equipamento de um dos carros parou de funcionar à 0h24. Doze minutos depois, essa mesma caminhonete vai embora com o GPS desligado.
Às 0h36, duas caminhonetes do Bope deixam a UPP. Na primeira, há dois policiais em pé e um sentado. Em seguida, sai o carro em que o equipamento de localização por satélite não funciona. Neste, a caçamba está mais cheia. São dois policiais em pé, um agachado e outro, do lado direito, sentado, com a perna para fora.
As imagens levantaram suspeitas no MP. Os peritos, no entanto, só confirmaram a suspeita quando trataram as imagens no computador as imagens da câmera de segurança. Eles usaram variações de luz e sombra, que são elementos básicos para revelar o volume e a profundidade de objetos.
“Isso já chamou atenção. Fugiu ao padrão das demais viaturas. Num primeiro momento, você olha a imagem, você não percebe nada. Graças ao trabalho da nossa pericia, que foi melhorando a imagem, aí você olha de novo.... Tá esquisito esse negócio”, afirma a promotora Carmem Eliza Bastos de Carvalho.
Volume levantou suspeitas
Foi esse ponto que chamou atenção dos promotores. Os peritos do MP enxergaram um volume, enrolado num material preto.
“As testemunhas falam que foi solicitado uma capa de uma moto. O que a gente conclui é que o corpo do Amarildo foi colocado naquela capa da moto. Uma capa preta e fechado com fita adesiva. Lacrado, né”, explica a promotora.
Ela acrescenta que a tecnologia ajudou. “Olhando, ninguém presta atenção. Mas com a tecnologia, foi aprimorando, aprimorando. Tem um volume aqui. Isto é um volume e o volume é compatível com um cadáver. É um cadáver, não sabemos. Tem que se investigar”, diz sobre as imagens.
“Não existe esse volume em nenhuma outra viatura do Bope que ali estava. Então, não podemos dizer que é um instrumento que o Bope carrega, não tem em outras viaturas, né”, acrescenta.

O relações públicas da Polícia Militar, coronel Frederico Caldas, disse que as equipes do Bope podem carregar equipamentos nas caçambas das caminhonetes. a tropa pode carregar equipamentos na caçamba das caminhonetes. "Não dá pra afirmar que, nesse caso, eles estavam levando algum tipo de material. Agora, é comum que uma tropa especial leve consigo equipamentos que possam gerar algum tipo de volume", destacou.
Sem câmera e sem GPS
Outro detalhe intriga os promotores. A 550 metros da saída da UPP, as duas caminhonetes param numa rua, onde há mais duas câmeras.
Os policiais saltam e, um minuto e meio depois, os carros vão embora.
O MP diz que a iluminação da rua não permite ver o volume na caçamba. A caminhonete do Bope, no entanto, tem um banco. E os peritos não descartam a possibilidade de o volume ter sido colocado embaixo do assento. Essa imagem ainda está passando por novos exames.
Pelo GPS que continuou funcionando em uma das caminhonetes, os peritos do MP descobriram que os policiais levam quase seis minutos entre os dois pontos. Só que, nesse caminho, eles param por cerca de dois minutos num ponto cego, onde que não tem qualquer câmera de monitoramento.
“Vamos ter que investigar o que aconteceu nesse percurso. Tudo é possível, a gente não sabe o que aconteceu”, diz a promotora Carmem Eliza Bastos de Carvalho.
O MP afirma que o GPS da caminhonete que carregava o volume só voltou a registrar o itinerário 58 minutos depois de ter parado de funcionar.
“Na lista do Bope, ele informa que aquele GPS estava inoperante. Na lista da secretaria de Segurança, ele está funcionando normalmente. Mais um espaço de uma hora sem emitir sinal. Tudo isso tem que ser investigado, apurado, esclarecido.

O relações públicas da Polícia Militar, coronel Frederico Caldas, enfatizou que a falha do GPS será devidamente investigada. "Essa informação só veio à tona agora. Então, certamente, essa informação também será checada agora no inquérito policial militar exatamente para verificar que tipo de mecanismo foi utilizado, porque toda tecnologia é feita justamente para proteger realmente o sistema de GPS para que ele seja de alguma forma preservado", afirmou.
Entenda o caso
O caso envolvendo o ajudante de pedreiro Amarildo de Souza começou no dia 14 de julho de 2013. Policiais da Unidade de Polícia Pacificadora da Rocinha estavam atrás dele, pois achavam que Amarildo sabia onde os traficantes guardavam armas e drogas.
Eles levaram Amarildo, primeiro, até uma das bases da UPP, na parte baixa favela. Uma câmera registrou a última imagem dele: passava das 19h. Amarildo entrou num carro da PM, que subiu para a sede da UPP, no alto do morro.
O então comandante da unidade, major Edson Santos, sempre disse que Amarildo foi ouvido por poucos minutos e que depois saiu de lá a pé, sozinho. Mas a Polícia Civil e o MP não tiveram dúvidas que o major mentiu.
A conclusão dos investigadores, em outubro do mesmo ano, foi de que a tortura aconteceu atrás dos contêineres da UPP. O ajudante de pedreiro recebeu descargas elétricas, foi sufocado com sacos plásticos e afogado num balde por quase duas horas.
Vinte e cinco policiais militares foram denunciados por tortura seguida de morte. O então comandante da UPP, Major Edson Santos, quatro PMs que participaram diretamente da violência, 12 que ficaram de vigia e 8 que estavam dentro dos contêineres e não fizeram nada pra impedir o crime.
PMs que colaboraram com as investigações contaram que o major estava em um dos contêineres e que era possível ouvir gritos. Quando os gritos pararam, segundo eles, um policial entrou num almoxarifado e pegou uma capa de moto preta. Os promotores afirmaram que o corpo foi enrolado nessa capa.
Dos 25 réus, 16 também respondem por ocultação de cadáver. A polícia civil fez várias buscas na mata, mas nunca conseguiu encontrar o corpo de Amarildo de Souza.

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